O câncer como matéria de linguagem
Limbo,
dramaturgia e direção de Alexandre França agora assinado pelo Coletivo de
Heterônimos, é um passeio pela linguagem. Dois atores elaboram a narrativa
múltipla a partir da existência de um ou de vários Guilhermes. O espetáculo vai
se construindo com suposições na cabeça do espectador. Nada é exato, tudo é metáfora e criação.
As
palavras transitam pela cena de modo a não construir apenas um sentido único.
Não se trata da retirada de um significado da narrativa. A proposição de
Alexandre França é, através das palavras, atravessar o espectador sem oferecer
apenas uma linguagem substituta para a cotidiana. Limbo apresenta, sem pretensões,
várias narrativas heterogêneas, sem hierarquia das palavras ou das narrativas.
Há a
criação de diversos olhares a partir da ideia de um câncer. O sofrimento, a
retirada da vida, a eminência da morte, a metáfora do câncer a se espalhar
sem direção por um corpo (humano ou político). Os atores, neste sentido, investigam a sonoridade das palavras de Limbo e
compactuam na intenção criadora, inventiva do texto.
O
espectador acompanha as suposições das vozes ali colocadas e leva consigo uma visão múltipla
sobre questões tão humanas: a morte, a vida, o sofrimento, a piedade... O
câncer de Guilherme, esse personagem sem rosto, também é uma metáfora do nosso
momento histórico. Pra onde esse câncer cresce? De onde ele surge? O que há
depois dele? O que fazer com este câncer? Caminhamos sobre suposições ao som,
distraído, de Guilherme Arantes.
A dramaturga Lígia Souza Oliveira é mestre em dramaturgia pela UFPR e doutoranda pela USP com tese sobre o dramaturgo francês Vàlere Novarina.